As Opiniões ou Eu Sei
Uma vida vale 438 euros
por Jorge Ferreira
2003-08-18 14:58
Eu sei que é politicamente correcto dizer bem de Bagão Félix. Eu sei que a vida humana vale pouco em Portugal.
Eu sei que a vida de cada pessoa não é susceptível de ser avaliada em numerário. Eu sei que para Guilherme Silva até morreu pouca gente nos fogos. Eu sei que há o pacto de estabilidade. Eu sei que há a necessidade de conter o défice.
Eu sei que meio país está de férias e que não é bom incomodar o descanso de quem não se preocupa. Eu sei que há atrasos no pagamento de inúmeras prestações sociais como nunca houve. Eu sei que há desempregados à espera do subsídio a que têm direito e nunca mais chega. Eu sei que o Estado deve milhões a fornecedores.
Mas apesar disso tudo não resisto a um desabafo. Li na página 7 do "Correio da Manhã", de 12 de Agosto deste ano da desgraça de 2003 e não acreditei. Mas parece que se confirma. No pacote de apoios sociais que disponibilizou para apoiar as vítimas dos incêndios, o Governo reservou-se a caridade de atribuir a cada família que teve vítimas mortais nos fogos a quantia de 438 euros. Oitenta e sete mil oitocentos e onze escudos.
Um morto num incêndio é o que vale. Nem mais nem menos. Um ordenado mínimo, mais tostão menos tostão, perdão, mais cêntimo menos cêntimo.
Eu sei que o ministro fez questão de dizer que desta vez a burocracia não vencerá e as famílias receberão em dinheiro vivo. Vá lá: sempre se poupa algum em formulários, impressos e outros bens perecíveis. Desta vez as pessoas não têm que ir ao banco, nem ao tribunal, receber esses gloriosos 438 euros. Receberão em vivo por um morto.
Suponho que o Governo entenderá esta capacidade de pagar em dinheiro vivo como exemplo de capacidade de acção. Como uma expressão de operacionalidade e prontidão. De eficácia tecnocrática.
Não vou entrar na demagogia dos estádios do Euro 2004, nem dos ordenados arábicos de alguns assessores de ministros, nem do desperdício que existe na Administração Pública, nem... (o director deu-me limite de caracteres para hoje).
Mas vou entrar no bom nome do Estado. Está em causa. Vou entrar na humanidade do Estado. Está em causa. Vou entrar no prestígio do Estado. Está em causa. Vou entrar no humanismo que às vezes se expõe em entrevistas para embelezar a comunicação, mas que depois desaparece nos fumos da desgraça. É falso.
E não me venham com as tretas da baixa política. Cheira a desespero de quem sabe que falhou. Portugal, além de respeito pelos mortos, talvez jamais tenha precisado tanto de política como agora. Da séria.
Francamente.
Lisboa, 14 de Agosto de 2003"
Jorge Ferreira"
A essência do "discurso" de JF, é em si irrepreensível:
Todos temos direito à opinião, é um dado absolutamente inquestionável.
Contudo, tendo em conta que JF faz parte de uma nova força política: o Partido Nova Democracia - não vou dissecar ou comprometer a sua posição política, ideológica; aquilo que pretendo é analisar a dinâmica partidária, a procura de “poder”, inclusa/implícita no comentário publicado - procura encontrar o "seu lugar ao sol" no cenário político-partidário português/internacional.
As eleições Europeias aproximam-se, e é compreensível que a "campanha" já se tenha iniciado para esta nova força.
À luz da "ciência política" é comum a demagogia dos partidos que não têm possibilidade de alcançar o poder. Também é, ou deveria ser sabido que, entre a teoria e a realidade existe um fosso extraordinário!!
Ora, é bonito!, fica bem!, dissertar (e não digo que até não possa concordar com parte das suas afirmações!) sobre as questões apontadas, mas também é claro o conteúdo demagógico, de quem alega que agora, mais do que nunca é necessária uma política séria! E é, de facto, necessário hoje mais do que ontem que a política seja séria, correcta e transparente. Mas, sem demagogias - com consciência de que, quando no poder, nem sempre é possível aplicar todas as medidas propostas! Essa é a falha da política! Não ser capaz de encarar essa verdade: tanto aqueles que ocupam o poder, como aqueles que estão na oposição!
Para fazer-se uma política séria.. (talvez passa-se por acabar com a política!!) teriam de ser revelados todos os “jogos”, todos os "golpes", mais ou menos claros, aplicados para ascender/alcançar/manter, ou não, o poder!
É aí que a política se revela: na ascensão, na obtenção e permanência no Poder/poder. Apenas, e somente: o Poder/poder.
As eleições Europeias aproximam-se, e as forças vão "limpando" as "armas"!
"Francamente"
por Jorge Ferreira
2003-08-18 14:58
Eu sei que é politicamente correcto dizer bem de Bagão Félix. Eu sei que a vida humana vale pouco em Portugal.
Eu sei que a vida de cada pessoa não é susceptível de ser avaliada em numerário. Eu sei que para Guilherme Silva até morreu pouca gente nos fogos. Eu sei que há o pacto de estabilidade. Eu sei que há a necessidade de conter o défice.
Eu sei que meio país está de férias e que não é bom incomodar o descanso de quem não se preocupa. Eu sei que há atrasos no pagamento de inúmeras prestações sociais como nunca houve. Eu sei que há desempregados à espera do subsídio a que têm direito e nunca mais chega. Eu sei que o Estado deve milhões a fornecedores.
Mas apesar disso tudo não resisto a um desabafo. Li na página 7 do "Correio da Manhã", de 12 de Agosto deste ano da desgraça de 2003 e não acreditei. Mas parece que se confirma. No pacote de apoios sociais que disponibilizou para apoiar as vítimas dos incêndios, o Governo reservou-se a caridade de atribuir a cada família que teve vítimas mortais nos fogos a quantia de 438 euros. Oitenta e sete mil oitocentos e onze escudos.
Um morto num incêndio é o que vale. Nem mais nem menos. Um ordenado mínimo, mais tostão menos tostão, perdão, mais cêntimo menos cêntimo.
Eu sei que o ministro fez questão de dizer que desta vez a burocracia não vencerá e as famílias receberão em dinheiro vivo. Vá lá: sempre se poupa algum em formulários, impressos e outros bens perecíveis. Desta vez as pessoas não têm que ir ao banco, nem ao tribunal, receber esses gloriosos 438 euros. Receberão em vivo por um morto.
Suponho que o Governo entenderá esta capacidade de pagar em dinheiro vivo como exemplo de capacidade de acção. Como uma expressão de operacionalidade e prontidão. De eficácia tecnocrática.
Não vou entrar na demagogia dos estádios do Euro 2004, nem dos ordenados arábicos de alguns assessores de ministros, nem do desperdício que existe na Administração Pública, nem... (o director deu-me limite de caracteres para hoje).
Mas vou entrar no bom nome do Estado. Está em causa. Vou entrar na humanidade do Estado. Está em causa. Vou entrar no prestígio do Estado. Está em causa. Vou entrar no humanismo que às vezes se expõe em entrevistas para embelezar a comunicação, mas que depois desaparece nos fumos da desgraça. É falso.
E não me venham com as tretas da baixa política. Cheira a desespero de quem sabe que falhou. Portugal, além de respeito pelos mortos, talvez jamais tenha precisado tanto de política como agora. Da séria.
Francamente.
Lisboa, 14 de Agosto de 2003"
Jorge Ferreira"
A essência do "discurso" de JF, é em si irrepreensível:
Todos temos direito à opinião, é um dado absolutamente inquestionável.
Contudo, tendo em conta que JF faz parte de uma nova força política: o Partido Nova Democracia - não vou dissecar ou comprometer a sua posição política, ideológica; aquilo que pretendo é analisar a dinâmica partidária, a procura de “poder”, inclusa/implícita no comentário publicado - procura encontrar o "seu lugar ao sol" no cenário político-partidário português/internacional.
As eleições Europeias aproximam-se, e é compreensível que a "campanha" já se tenha iniciado para esta nova força.
À luz da "ciência política" é comum a demagogia dos partidos que não têm possibilidade de alcançar o poder. Também é, ou deveria ser sabido que, entre a teoria e a realidade existe um fosso extraordinário!!
Ora, é bonito!, fica bem!, dissertar (e não digo que até não possa concordar com parte das suas afirmações!) sobre as questões apontadas, mas também é claro o conteúdo demagógico, de quem alega que agora, mais do que nunca é necessária uma política séria! E é, de facto, necessário hoje mais do que ontem que a política seja séria, correcta e transparente. Mas, sem demagogias - com consciência de que, quando no poder, nem sempre é possível aplicar todas as medidas propostas! Essa é a falha da política! Não ser capaz de encarar essa verdade: tanto aqueles que ocupam o poder, como aqueles que estão na oposição!
Para fazer-se uma política séria.. (talvez passa-se por acabar com a política!!) teriam de ser revelados todos os “jogos”, todos os "golpes", mais ou menos claros, aplicados para ascender/alcançar/manter, ou não, o poder!
É aí que a política se revela: na ascensão, na obtenção e permanência no Poder/poder. Apenas, e somente: o Poder/poder.
As eleições Europeias aproximam-se, e as forças vão "limpando" as "armas"!
"Francamente"