segunda-feira, fevereiro 23, 2009

Carnaval Pagão

O Carnaval Pagão
(Do século VII a.C. ao século VI d.C.)

O Carnaval Pagão começa quando Pisístrato oficializa o culto a Dionísio na Grécia, Séc. VII a.c. e, termina, quando a Igreja adopta, oficialmente, o carnaval, em 590 d.c.

- O Segundo local por excelência do Carnaval

O Segundo Centro de Excelência do Carnaval localiza-se na Grécia e em Roma, entre o Séc. VII a.C. e VI d.C..

Com as sociedades já organizadas em castas, e rígidas hierarquias, com a nobreza, o campesinato e os escravos, nitidamente separados por classes, acentuam-se as libertinagens e licenciosidades, provocadas, ao que se supõem, pela necessidade de válvulas de escape (era o culto ao corpo sem a culpa apregoada pela filosofia escolástica).

Sexo, bebidas e orgias incorporaram-se, definitivamente, às festas que, juntamente com o elemento processional e a inversão de classes, compõem o modelo que alguns autores consideram o fulcro estético e etimológico do carnaval...

As Dionísias Gregas

Dionísio:

de Dio (s), céu, em Trácio e Nysa, filho do céu, também chamado Baco - ambos nomes de origem grega, sendo que Baco aparece pouco um mais tarde na literatura grega (em Édipo Rei, de Sófocles - Séc. V a.C.)- tem outros epítetos, como IACO, BRÓMIO e ZAQUEU.

Esses nomes, com o mesmo significado, surgem em cultos no mundo mediterrânico.

IACO:
Grande grito, era o deus que conduzia a procissão nos mistérios de Eleuses (Grécia) com exclamações colectivas de entusiasmo por parte dos peregrinos.

BRÓMIO:
Significa “estremecimento, ruído surdo e prolongado”. Era uma espécie de transe que se apossava dos adoradores do deus durante o seu culto.

ZAQUEU:
Nome com que Dionísio era conhecido, sobretudo, na Ásia Menor e em Creta.
Zaqueu é o grande caçador que aparece em algumas peças de Esquilo, no Séc. VI a.C..

DIONISIO, como era mais conhecido, permaneceu por longo tempo confinado nos campos, aparecendo apenas, tardiamente, na Pólis de Atenas.

A explicação é dada por Junito de Souza Brandão em sua Mitologia Grega, (pág. 117 e 133): “Viu-se que o deus do êxtase e do entusiasmo, até mais ou menos a década dos anos 50, era considerado como uma divindade que chegara tardiamente à Hélade. Pois bem, a partir de 1952, as coisas se modificam: é a decifração de uma parte dos hieróglifos cretomicênicos por Michael Ventris, segundo se mostram no Volume I, pág. 53 ou mais precisamente, a decifração da linear B, consoante a classificação de Arthur Evans, demonstrou que o deus já estava presente na Hélade, pelo menos desde o século XIV a.C., conforme atesta a tabela X de Pilos. Há de se perguntar por que um deus tão importante, já documentado no século XIV, só se manifesta de forma aparentemente grotesca, no século IX e só a partir dos fins do século VII a.C. tem sua entrada solene na mitologia e na literatura? É quase certo que o adiado aparecimento de DIONISO e sua tardia explosão no mito e na literatura se deveram sobretudo a causas políticas. Com seu êxtase e entusiasmo o filho de Semethe era uma séria ameaça à Pólis aristocrática, à Pólis dos Eupátridas, ao status quão vigente cujo suporte religioso eram os aristocratas deuses olímpicos. Com as características, ora de deus da cultura do vinho e da figueira, ora simbolizado pela Hera e pelos Pinheiros, ora representados pelo bode, Dioniso, o deus da transformação e da metamorfose, que havia sido expulso de Olimpo, todos os anos, chegava à Grécia, aos primeiros raios de sol da primavera, acompanhado de um séquito de sátiros e ninfas sendo saudado pelos fiéis com música, danças, algazarras, vinhos, sexo e também violência, que por vezes terminava em tragédia”.

Teria sido PISISTRATO, governante de Atenas (605 - 527 a.C.) o responsável pela oficialização do culto a Dionisio na Grécia.

PISISTRATO além de incentivar o culto a Dionisio entre os camponeses e lavradores, organizou oficialmente as procissões dionisíacas onde a imagem do deus Dionisio era transportada em embarcações com rodas (carrum navalis) simbolizando que o deus havia chegado a Atenas pelo mar, puxadas por sátiros (semi deuses que segundo os pagãos tinham pés e pernas de bode e habitavam as florestas) com homens e mulheres nús, em seu interior.
Seguindo o cortejo, uma multidão de mascarados, meio a um touro, que depois seria sacrificado, percorria as ruas de Atenas em frenéticas passeatas de júbilo e alegria.
A procissão terminava no templo sagrado, o Lenaion, onde se consumava a hierogamia (o casamento do deus com a Polis inteira em procura da fecundação).

Em Atenas, a festa em louvor a Dionisio desdobrava-se em quatro celebrações:
as Dionísias Rurais, as Leneias, as Dionísias Urbanas ou Grandes Dionisias e as Antestérias, que se estendiam de Dezembro a Março.

Estas festas que tiveram grande desenvolvimento no Séc. VI a.C., acabaram por gerar o que se pode chamar “confusão Dionisíaca”, por isso foram fortemente reprimidas no Séc. V a.C., no auge do desenvolvimento artístico e cultural da Grécia (governo de Péricles - 443 - 429 a.C.) quando a cidade foi embelezada por monumentos, como o Partenon, espalhando o seu brilho por todo o Mediterrâneo.

Nesse tempo mudou, inclusive, a excelência grega e a concepção do teatro. O Séc. V a.C. foi o grande período da Grécia Clássica.
Entretanto a influência política e cultural apenas atingiu o seu esplendor no Séc. IV quando Alexandre, o Grande, expandiu as conquistas gregas, estabelecendo colónias em lugares tão afastados como o leste do Afeganistão e as fronteiras da Índia.
É a chamada época Helénica.
Nessa ocasião foi introduzida na Grécia o culto a Isis.

Em 370 a.C., quando Atenas perde a hegemonia da arte já se pode sentir a penetração do culto a Dioniso em Roma.

As Bacantes, eram sacerdotisas que celebravam os mistérios do culto a Dionisio, nesse tempo conhecido como BACO (é com o nome de BACO que Dionisio entrou em Roma), ao invadirem as ruas de Roma, dançando, soltando gritos estridentes e atraindo adeptos em número crescente, causaram tais desordens e escândalos que o Senado Romano proibiu as Bacanais, em 186 a.C..

As Saturnálias Romanas

Saturno, deus da agricultura dos antigos romanos, identificado como Cronos pelos gregos, pregava a igualdade entre os homens, e teria ensinado a arte da agricultura aos italianos.

Também expulso do Olimpo, Saturno chegava com os primeiros sopros do calor da primavera e era saudado com festas e um período de liberação das convenções sociais.

Durante as Saturnálias os escravos tomavam os lugares dos senhores.
Não funcionavam nem os tribunais, nem as escolas.
Os escravos saiam às ruas para comemorar a liberdade e a igualdade entre os homens, cantando e divertindo-se em grande desordem.

As casas eram lavadas, após os excessos libertários que aconteciam de 17 a 19 de Dezembro (no hemisfério norte correspondia à entrada da primavera. Com a reforma do calendário e a inclusão de mais dois meses, Julho e Agosto, em homenagem aos imperadores romanos Júlio Cesar e Augusto formam empurrados para diante) seguiam-se a sua Purificação com as Lupercais, festas celebradas a 15 de Fevereiro, em homenagem ao deus Pã que matou a loba que aleitara os irmãos Rómulo e Remo, fundadores de Roma.

Os Lupercos, sacerdotes de Pã, saiam nús dos templos, banhados em sangue de cabra e depois lavados com leite e cobertos por uma capa de bode perseguiam as pessoas pelas ruas, batendo-lhes com uma correia.

As virgens quando atingidas acreditavam terem-se tornado férteis, e as grávidas, se tocadas, conseguiam livrar-se das dores do parto.

Suetónio conta que no tempo das Saturnais todos os participantes e os escravos podiam dizer verdades a seus senhores indo até ao extremo de ridicularizá-los da forma que bem entendessem.

O filósofo alemão (Friederich) Nietzsche - 1844-1900 - na sua obra, O Nascimento da Tragédia, a propósito de Dionísio e Apolo, deuses opostos, entre o caos e a ordem, investiga estes “mitos” e suas influências na vida humana, as quais regulam o equilíbrio entre as forças antagónicas, e permitem uma realidade mais equilibrada.
Para Nietzsche, a arte é a única justificação possível para o sofrimento humano, por isso combate a moral cristã que lhe parece fruto do ressentimento de frustados. Anticristão e ateu, o escritor exalta a vontade de poder do grande indivíduo (super homem).
Justificando o posicionamento de Nietzsche, José Guilherme Merquior, em “Saudades do Carnaval” diz:
“é fácil calcular a intensidade dos inconvenientes dessa atitude anti-natural quando a civilização racionalizada da Idade Moderna suprimiu justamente os pulmões carnavalescos da cultura.

O Cristianismo da sociedade industrial, a religiosidade no tempo de Nietzsche não só havia negou e sufocou todas as válvulas orgiásticas - toda uma composição sistemática com erros e carisma - como virara franca ideologia da sublimação ressurgida das massas aburguesadas, era nesse contexto, que a moral da renúncia significa repressividade absoluta, e repressividade doentia, “indecorosa” para usar a expressão do anti-cristo. O ascetismo vitoriano, a serviço da massificação repressiva, da “redução à mediocridade”, de todas as dimensões morais do homem eis o que levou Nietzsche a desmascar, indignado, o cristianismo”.

O Carnaval como uma festa, um rito colectivo, onde foliões fantasiados e mascarados transformam-se num “outro”, numa espécie de efeito catártico regulador do equilíbrio social.

O Carnaval é uma trégua, um alívio da hipocrisia social e do medo do corpo.

- Hiram Aráujo
Vale a pena ver: Os Caretos de Podence