sexta-feira, abril 11, 2008

O debate quinzenal na AR

O que é que se pode dizer de um debate tão inconsequente, como aquele que teve lugar, hoje, na AR?

É o descalabro.

O vazio.

A falta de coerência, a falta de hombridade, a falta de integridade política.

A classe política queixa. Mas, queixa do quê?
Ri-se. Mas, ri-se do quê?
Não há motivos nem para queixas, nem para risos.

Estamos perante um divórcio absoluto entre a fina flor política, e a gesta gente.
A fina flor não passa cartão ao povinho, e o povinho está-se perfeitamente ... para a fina flor.

Falarem ou estarem calados, dá no mesmo.

Grande Ramalho, dá-lhes com um molho de urtigões pelas ventas:

Deixando de ser uma lucta de principios e de idéas a politica converte-se fatalmente em uma questão de compadres.

O compadrio elevado á cathegoria de instituição nacional, domina tudo, corrompe tudo, dissolve tudo. Os partidos que não pódem conquistar o appoio da opinião pelas idéas que representam, procuram manter-se pelo appoio dos compadres que favorecem. É na proporção exacta do numero dos compadres que annualmente despacha e emprega, que um partido augmenta ou diminue de adeptos, progride ou retrograda na confiança da corôa e no favor da urna.

O dogma fundamental do compadrio impõe-se por tal modo que transforma todas as outras noções moraes segundo o criterio de que elle é a expressão. Transforma a justiça, a honra, a probidade, a propria consciencia. Nenhum partido politico ousa violar o compadrio: seria commetter a mais vil e a mais nefanda das traições politicas!

Despachando o compadre mais serviçal com exclusão do adversario mais competente todo o governo honesto julga praticar um acto de gratidão e de lealdade. E ninguem vê quanto ha de profundamente subversivo da ordem moral n'este simples facto tão vulgar, tão frequente, tão despercebido: a exclusão da competencia! Excluir a competencia, ou quando menos preteril-a, por um anno, por um mez, por um dia, por uma hora que seja, é commetter o attentado mais criminoso de que o Estado póde ser réo deante da sociedade. Esse attentado resume todas as violações do direito e todas as affrontas da justiça. É um roubo violento e descarado, aggravado com a offensa do merito, com a injuria da capacidade, com o insulto ao trabalho, com o escarneo á moral, com o ultrage ao dever.

Na politica portugueza, que tem o seu calão como as mulheres publicas e como os ratoneiros, esse crime infame toma o nome dourado de compromisso politico ou de acto de fidelidade partidaria. E do ministro que o pratica e para o qual se deveria pedir a prisão correccional ou o degredo com trabalhos publicos, a opinião diz apenas:—É fiel aos seus correligionarios, sabe ser amigo, despachou o compadre, vou para o partido d'elle.

O officio do governo é servir o paiz. Como porém o paiz, por effeito do machinismo eleitoral, é representado constantemente pelos compadres do governo, o officio do governo em ultima analyse não é mais do que servir o compadre. Está no seu destino. Graças aos elementos de corrupção de que o governo dispõe, o cidadão, não votando como cidadão mas votando como compadre, dá o primeiro impulso que põe em movimento toda a engrenagem do systema: elegendo o compadre é elle mesmo que funda a tyrannia absoluta e despotica do compadrio que depois o governa.

A sociedade está á mercê do compadre. E se ha poder que possa contrabalançar alguma vez, em dadas conjuncturas, o poder do compadre, esse poder é unicamente—o da comadre.

A aptidão provada, a capacidade, o talento, o trabalho, a firmesa no dever, a tenacidade no estudo, a mais alta comprehensão e o mais rigoroso cumprimento da solidariedade e da honra—palavras, palavras, unicamente palavras! Na esphera dos fattos, na ordem pratica, positiva, real; compadrice, comadrice—eis tudo.