sexta-feira, maio 07, 2004

O Meu Corpo: É Meu

Num repto ao post do amigo CN, uma visão distinta, pelo menos sobre alguns dos pontos que foca, contudo não discuto o tema em si, o qual já tive oportunidade de analisar há algum tempo:

"Por que se pode negar a comunhão aos legisladores que favorecem o aborto?"
Ou o direito a excluir.

Em relação à legitimidade da Igreja Católica, ou de qualquer outra Igreja, em excluir os "prevaricadores" das suas regras, considero que essas 'Igrejas' têm toda a legitimidade de o fazer a partir do momento em que, as pessoas que delas participem, saibam quais essas regras são.
Se concordarem com elas ficam e têm de as respeitar, se não concordarem, ou saem, ou nem sequer chegam a entrar, e aí estão desvinculas de qualquer aplicação das mesmas.

Também lhe digo, aparte o título, conteúdo ou espírito da sua publicação, que o Meu Corpo é Meu, inilídivel. Inalienável, inviolável, e do qual eu sou dona e senhora.
Não permito que ninguém: seja indivídual, seja colectivo, me dite, dê ordens ou pretenda impor-me ou estabelecer-me regras em relação ao mesmo.
Quando refere: "o corpo é a minha propriedade", presumo que se esteja a referir àquelas cenas e episódios 'patéticos' à porta do Tribunal de Aveiro, e às respectivas 'arruaças'; aí estamos perante um espectáculo de circo, digno de uma novela cómica. E não de pessoas conscientes, com dignidade e determinação de vida.

Mas distinguindo:
Direito natural - um conjunto de princípios 'universais' e eternos, concretizadores da justiça, acima do direito que vigore em qualquer época, em qualquer momento, em qualquer comunidade, estado, país, etc.
A Escola, dita, Clássica refere como fonte do direito natural a Razão, enquanto que para a Escola, dita, Histórica fundamenta com o espírito de cada povo e de cada época, que ditaria os princípios do direito natural. Por outro lado, o dito, positivismo jurídico afirma que só a vontade humana é fundamento do direito.

Propriedade e Posse:

Propriedade - Um direito real que integra todas as prerrogativas que se pode ter sobre um bem. Nomeadamente, "o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas."
Posse - Na linguagem corrente utiliza-se muitas vezes o termo Posse, para falar de propriedade, contudo, posse e propriedade são realidades distintas. Podem coincidir ou não no mesmo titular. Além do que, a posse existe em relação a qualquer outro direito real e não apenas em relação à propriedade.
Carece de 2 elementos: um material (corpus) - o exercício dos poderes correspondentes ao direito sobre a coisa, e, um psicológico (animus) - consiste na vontade do possuidor de actuar como titular do direito.

Uma vez que se falou em direito real, explica-se: trata-se de um direito subjectivo que recai directamente sobre coisas ou realidades a elas juridicamente semelhantes, conferindo ao seu titular poderes sobre elas e o direito de exigir de todos os outros uma atitude de respeito pela utilização que delas faça, de acordo com os poderes que tal direito lhe confira; trata-se, pois, do que se designa por um direito absoluto, i.e., é oponível pelo seu titular a todas as pessoas.

A propriedade não tem que ser escassa, para sobre algo existir um direito de propriedade. A propriedade exerce-se sobre bens vastos, comuns, limitados ou escassos. Não é fundamental, ou essencial que o bem seja escasso para ser exercido o direito de propriedade. Ou, posse.

Os Direitos de Personalidade, Direito Pessoal e os Direitos de Propriedade Intelectual:

Direitos de Personalidade - Estamos perante um direito legítimo, que diz respeito directamente à pessoa em causa, i.e., a pessoa que detém o direito. É um direito juridicamente protegido, do qual todas as pessoas dispõem, possibilitando-as a obter o respeito de todos os elementos que compõem a sua personalidade (corpo, imagem, nome, pensamento, honra, etc).
Direito Pessoal - Direito de tal modo inerente à pessoa (direitos de personalidade, direitos de família, etc.), que é inalienável e intransmissível, não podendo traduzir-se num valor económico, i.e., é insusceptível de avaliação pecuniária.
Direitos de Propriedade Intelectual - Diz, em regra e de forma genérica, a propriedade industrial e da propriedade a que se referem os direitos de autor (direito atribuído ao criador de uma obra intelectual, seja qual for o género desta ou a sua forma de expressão, que consiste na faculdade de reinvindicar a autoria da obra e de assegurar a sua integridade e genuinidade, reagindo, e abrange igualmente o carácter patrimonial. Claro que depois podemos entrar em várias áreas do direito de autor e conexos, no que toca à encomenda de uma obra, em que a autoria passará a pertencer a quem encomendou. Não agora.).

Quanto à regulamentação dos Direitos por parte do Estado: há os chamados direitos naturais, que existem independentemente da sua regulação.
O Estado, que nós Liberais à partida queremos mínimo, tem como uma das suas funções fundamentais, e que constitui um dos seus 3 Pilares, é o de Legislar (regulamentar); obtendo de forma, uma organização que se quer coerente e equilibrada. Inbuída num espírito de equidade e justiça igual para todos.

Quando diz: "Quanto ao aborto, que prova maior que a esquerda (ou será a social-democracia de esquerda e direita?) é também muito sensível aos interesses "egoistas", económicos, e individuais, do livre arbítrio total sobre a propriedade e a posse, indo ao ponto de serem maiores do que o direito à vida? É sempre uma supresa ouvir as mulheres de esquerda a proclamar - o corpo é a minha propriedade!"

Uma questão político-filosófica, que refere, e a meu ver bem, a realidade em que a esquerda está mergulhada: uma profunda hipocrisia e incoerência entre, o que dizem e, o que fazem.
Naturalmente, que têm legitimidade de mudar de opinião e 'evoluir'! Mas, são incoerentes.

A ética, é essencialmente e de uma forma básica, individual. O indivíduo ou tem em si, capacidade, vontade e interesse em pautar-se, em aprender, em desenvolver um conjunto de regras que respeitem, tanto a si mesmo, como aos outros, num sistema pessoal e de interactividade equilibrado, ou não.
Quando se pretende impor, de uma forma, como está muito em voga, securitária, acaba-se por ter indivíduos que, não só se debatem contra uma conjunto de regras regulamentadas, como também não se revêm ou aceitam que essas normas se lhes apliquem: quer porque as consideram desajustadas; injustas, desiquilibradas; excessivas; violadoras dos seus direitos pessoais.
Mas, também quem considerem que existe deficiência de regras, exigindo mais regras, mais constritoras e coercivas.

Não existe perfeição.

O Caminho é sempre individual; com respeito pelos restantes indíviduos que connosco co-existem.