Chão África
Sumira-se do sol o fulgido clarão,
Em rutilância astral, febril, silenciosa,-
Como um beijo subtil, suspenso na amplidão!
Corria pelo espaço a brisa pressurosa,
Lançando pela terra um fluido inebriante
Como essência de nardo ou bálsamo de rosa!
Uma harmonia doce, airosa, emocionante,
Pairava sob a concha azul do firmamento,
Como arpejos subtis dum bandolim distante!
Numa conjugação de astral deslumbramento,
Surgem, no infinito, as fúlgidas estrelas,
Em branco lucilar silencioso e lento!
Desprendem-se do céu as negras bambinelas...
- Um mádido clarão desprende-se do espaço,
Como risos gentis de cândidas donzelas!
Um bailundo boçal, rendido de cansaço,
Depois de ter cavado e revolvido a terra,
Conduz para a cubata o fruto do seu braço...
- Vinha atrás dele a rude companheira,
De quinda na cabeça - olhos errantes-
Consumida de fome e de canseira
De trabalhar nas lavras, - lá distantes...
... E a lua, por detrás daquela serra,
- Em fulgurações lúcidas, marfíneas,
Vem surgindo, surgindo brandamente,
Como um lábio febril que se descerra
Em contracções maviosas, veludíneas,
Depondo-nos na fronte um beijo ardente!
Pairavam n'amplidão eflùvios irrequietos
Das vaporizações nocturnas, penetrantes,
Como um bando fugaz de túrbidos insectos...
Da lua argêntea e calma as réstias misteriosas
Penetravam do espaço o cálido ambiente,
Vagarosa, subtil, silenciosamente,
Em lácteas projecções amenas, vaporosas...
Chegavam até nós, suavemente,
Exalações de essências resinosas...
Era uma paz serena, augusta, etérea e calma,
Hierática, bendita...
Um brilho diuturnal iluminava a alma
De uma luz fulgurante, olímpica, infinita!
Andava pelo espaço uma alegria mansa,
Em transcendência astral de luz crepuscular...
- A Terra, em placidez, parece que descansa
Sob as fulgurações seráficas do luar!
Mas nos confins sombrios da floresta
- No âmago da selva lá distante-
Pairam rumores gentílicos de festa,
Em volta de fogueira crepitante...
Como quem sente irritação molesta,
Tal a grita medonha, impressionante
Dos negros, numa chusma incalculável,
No auge de um batuque formidável!
- M. Correia da Silva, Orgia Gentílica